terça-feira, 26 de junho de 2012

Pela extinção do Tribunal Constitucional (2)

Já tinha aqui escrito que, perante o descrédito total em que caiu o Tribunal Constitucional, os seus defensores tinham encetado uma campanha na opinião pública destinada a tentar salvar esse tribunal.  Depois de um debate monolítico na Faculdade de Direito, vem agora Paulo Rangel em artigo no público intitulado Em defesa do Tribunal Constitucional, qualificar a ideia da sua extinção como a "mais inoportuna, mais ligeira e mais indesejável". Que a classe política tenha estes qualificativos em defesa de um tribunal político enxertado no poder judicial, não me espanta absolutamente nada. Na verdade, este tribunal interessa muito aos políticos, mas não interessa minimamente à defesa dos direitos dos cidadãos.

Paulo Rangel recorda que se "que se aguardam nos próximos meses decisões sensíveis e difíceis daquele Tribunal. Como confiar nelas se se advoga (…) a respectiva extinção?" O argumento está invertido. A razão porque se defende a sua extinção é precisamente porque não se confia na capacidade de o Tribunal Constitucional tomar essas decisões sensíveis e difíceis de forma independente do que são os desejos do poder político. As anteriores decisões sensíveis e difíceis foram afinal tomadas de uma forma fácil, na perspectiva de que os órgãos de soberania têm as mãos completamente livres em período de crise financeira. Mas para defender isso, não é preciso nenhum Tribunal Constitucional.

Aliás Paulo Rangel acaba por confessar que o Tribunal Constitucional não tem aplicado a Constituição, quando diz que "interpretar a Constituição é também, num certo sentido fazer a Constituição; é ainda, mesmo que só epidermicamente, participar do poder constituinte". Ou seja, o texto que os constituintes nos deixaram, e para o qual foram eleitos pelo povo, pode a todo o tempo ser reescrito através de uma interpretação completamente livre do Tribunal Constitucional. Mas isso significa esvaziar a Constituição, que é aliás o que a jurisprudência vaga e complacente do Tribunal Constitucional tem vindo precisamente a fazer.

Paulo Rangel acha no fim que o Tribunal Constitucional tem mais legitimidade democrática do que o poder judicial porque é eleito pelo Parlamento. Está enganado. A legitimidade democrática do poder judicial resulta do facto de aplicarem a lei que é votada pelos representantes do povo e de o fazerem com independência no seu julgamento. Não resulta de uma escolha política, precisamente com a preocupação de como irão ser decididos os futuros casos "sensíveis e difíceis", e muito menos da proximidade aos partidos.

Em relação a essa proximidade, relembro só dois casos: houve um juiz do Tribunal Constitucional que no dia seguinte a ter renunciado era cabeça-de-lista de um partido numas eleições ao Parlamento Europeu. Houve outro juiz do Tribunal Constitucional que só lá esteve um mês, indo logo a seguir para Ministro. Deve ser assim, como afirma Paulo Rangel, que a existência do Tribunal Constitucional se torna "um factor de reforço da legitimação de todo o poder judicial". 

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