segunda-feira, 22 de setembro de 2008

O dia europeu sem carros.

Considero um dos maiores exercícios de hipocrisia a iniciativa do dia europeu sem carros. Na verdade, ao contrário do que se tem defendido, esta iniciativa é contraproducente para a defesa do ambiente. A abstenção da utilização do carro um dia por ano não tem quaisquer efeitos na redução das emissões, apenas servindo para tranquilizar as consciências das pessoas, que continuam a poluir alegremente os restantes dias do ano. Quanto aos incentivos para abandonar o automóvel, ninguém os apresenta. Só o aumento do preço dos combustíveis é que está a levar as pessoas a deixar os carros em casa.

No início, quando foi lançada a iniciativa, o dia europeu sem carros era sempre sinónimo de caos em Lisboa. Logo à saída da praça de Espanha, a polícia, com imenso esforço, barrava a entrada aos automóveis, sendo que os condutores, perante esta atitude, os abandonavam no centro da praça (!), sem que a polícia fizesse absolutamente nada, desesperada para evitar que outros condutores tentassem passar. Como resultado, no fim do dia o espaço verde ali existente ficava completamente degradado, com muito maior lesão para o ambiente do que a passagem de alguns automóveis para o centro da cidade.

Em consequência, desde há uns anos para cá verificou-se uma redução dos espaços vedados ao trânsito, levando a que o dia europeu sem carros passe completamente despercebido à maioria dos lisboetas.

Por esse motivo, ignorando que hoje era o dia europeu sem carros desloquei-me de automóvel à baixa, onde precisava de tratar de um assunto profissional. À entrada do Rossio vejo uma barragem da polícia, que me fez suspeitar de um crime grave a decorrer, o que não era de estranhar perante a onda de violência que tem atingido o país. Perguntei o que se passava, e informaram-me então de que era o dia europeu em carros. Conformado, felizmente encontrei lugar onde estacionar nos Restauradores e fiz a pé as poucas centenas de metros que faltavam para o meu destino. O passeio até foi agradável, mas não deixei de me questionar se valeria a pena ocupar a polícia com esta iniciativa, já que seguramente apenas uma reduzidíssima área da Baixa ficou efectivamente vedada ao trânsito.

O que me deixou, no entanto, perplexo foi verificar quando voltei que a polícia deixava passar todos os carros oficiais para os ministérios a que se dirigiam, sendo que a maior parte deles, além do motorista, levava apenas uma única pessoa. Como é possível pretender que os cidadãos respeitem o dia europeu sem carros se o mesmo não é respeitado por quem deveria dar o exemplo? Com que moral se institui para o comum dos cidadãos uma regra que os titulares de cargos públicos se recusam pura e simplesmente a cumprir? Existe de facto um grave défice de cultura democrática no nosso país.

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